sábado, 16 de março de 2024

«Roubado a Cesário» - Parrado, Luís Filipe

ROUBADO A CESÁRIO

Mais tarde, pela fresca, fomos todos

roubar ameixas. Em algum momento,

nunca se soube qual,

de tão carregado que estava

um dos troncos cedeu ao peso dos frutos

e tombou por terra. Julguei que esse tinha sido

o ponto alto do dia, com os cestos

a abarrotar, cheios até cima,

mas tu enrolaste o cabelo num novelo

e prendeste-o com um lápis no topo da cabeça,

aparentemente sem te dares conta do que fazias.

Como um rasgão, em surdina,

eu vi a curva perfeita do teu pescoço.

 Luís Filipe Parrado, Museu da angústia natural, 2023, p. 10